“Pena de Edmundo prescreveu, diz STF
O ministro Joaquim Barbosa, do STF (Supremo Tribunal Federal), decidiu ‘extinguir a punibilidade’ da condenação do ex-jogador Edmundo, por entender que o caso prescreveu em 2007.
Em março de 1999, ele foi condenado a quatro anos e seis meses de prisão pelo homicídio culposo de três pessoas em um acidente de carro ocorrido em 1995 (…)
Ele havia sido condenado a três anos de prisão por homicídio culposo, e o tempo foi aumentado para quatros anos e seis meses por causa das outras duas mortes provocadas pelo acidente.
Para Barbosa, a prescrição deveria ser calculada com base na pena de três anos.
De acordo com a legislação brasileira, uma condenação maior do que quatro anos prescreve em 12 anos. Já uma pena de três não pode ser aplicada depois de oito anos.
Ainda cabe recurso. De acordo com o STF, pode-se pedir que caso seja analisado por outros ministros (…)
Nilo Batista, professor de direito penal da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), afirmou que ‘a prescrição faz parte do direito’".
Devemos sempre tomar cuidado com o sentimento de fatalismo quando estivermos lidando com leis. Nada no direito é para sempre ou existe porque é impossível de ser modificado ou porque deus quis. Ao contrário do que o professor entrevistado na última linha dá a entender, a prescrição faz parte do direito, mas não para todos os crimes e nem precisa ser assim.
O homicídio só prescreve no Brasil porque assim queremos. E ele prescreve em relativamente poucos anos porque, mais uma vez, assim queremos. Se quiséssemos diferente, bastaria mudar alguns artigos de uma lei ordinária (o Código Penal). E para mudar uma lei ordinária (que, o nome já diz, é a mais simples das leis), basta a maioria simples dos deputados e senadores. Enquanto para mudar a Constituição – que já foi mudada 67 vezes nos últimos 13 anos (algo como uma mudança a cada quatro meses) – precisamos do apoio de no mínimo 49 senadores e 308 deputados federais, é possível mudarmos o Código Penal (inclusive os artigo que tratam da prescrição) com o apoio de apenas 21 senadores e 129 deputados federais, se houver quórum mínimo para a votação. Logo, não podemos simplesmente ver as regras referentes à prescrição como algo que temos que aceitar e pronto. As leis existem e precisam ser respeitadas, mas elas também podem ser mudadas. Como todas as outras leis, o tempo de prescrição pode ser aumentado ou diminuído. Basta que nós, eleitores, queiramos e elejamos parlamentares que defendam essa ou aquela mudança.
A prescrição é uma opção social e não algo imposto pela natureza ou alguma entidade superior. Ela é uma criação social. No Brasil, escolhemos que os crimes de homicídio prescrevam (em 20 anos no caso do homicídio doloso). Já nos EUA, por exemplo, ele normalmente não prescreve. Não importa quanto tempo tenha transcorrido entre a morte e o processo (ou condenação): você poderá sempre ser condenado e punido por um homicídio doloso.
Mas nem todo crime prescreve no Brasil (crimes imprescritíveis). Por exemplo, se olharmos o art. 5o de nossa Constituição Federal, veremos que há dois crimes que jamais prescrevem: racismo e ação de grupos armados contra a ordem constitucional e o estado democrático.
À primeira vista parece justo. Ninguém que viver em um país onde o racismo seja tratado de forma leve pela lei. Mas pense bem: racismo é impedir alguém de exercer seus direitos. Homicídio é matar alguém. O primeiro é imprescritível, mas o segundo prescreve, no máximo, em 20 anos. Se alguém matar a família e ficar desaparecido por 20 anos (ou atropelar e matar três pessoas e o processo atrasar por 12 anos, como na matéria acima), o crime estará prescrito. Mas se aos 18 anos você impedir alguém de entrar em seu restaurante por causa de sua cor, aos 81 você ainda poderá ser condenado e preso, porque o racismo é imprescritível.
E não podemos nos esquecer que racismo não inclui procedência regional (nordestinos, sulistas, nortistas, paulistas etc) ou opção sexual, mas inclui raça, etnia, nacionalidade e religião. Logo, se Zezinho comete o mesmo crime contra duas pessoas – uma judia, negra e russa, e a outra maranhense e homossexual, por exemplo – o primeiro é imprescritível porque é racismo, mas o segundo prescreve porque procedência regional e opção sexual não estão dentro do conceito de racismo.